Boletim Informativo da
Associação Espírita de Estudos Evangélicos
Francisco de Paula Victor
 

O OUTRO LADO DE KARDEC

Muitos imaginam Kardec como um homem sisudo, sério, calculista, uma

pessoa até um tanto antipática. Ouvi uma vez na feira do Livro Espírita

realizada aqui em Limeira, uma visitante olhando para o retrato de

Kardec dizer ao outro: Nossa parece até que ele brigou com o mundo.

Mas na realidade, Kardec era um homem sensível à dor alheia e aos

problemas que estavam a sua volta. Muito embora sério e perquiridor,

sendo cognominado por Camile Flamarion como “o bom senso encarnado” ele

refletia junto aos amigos doçura, afabilidade, sentimento caritativo e

bom humor.

Alguns até acham que ele tinha sua ponta de vaidade, como a pêra que

usava junto com o bigode, a fim de esconder uma verruga.

Possuía zelo infatigável em seus trabalhos, desinteresse absoluto e

total abnegação de si mesmo, junto a uma constante perseverança na

direção da sociedade que presidiu até a sua desencarnação.

Zêus Wantuil e Francisco Thiesen descrevem que pelas suas feições Allan

Kardec mais parecia um alemão do que um francês. Era altivo e tenaz, mas

de temperamento calmo, precavido e realista até quase a frieza, céptico

por natureza e por educação, argumentador lógico e preciso, e

eminentemente prático em suas idéias e ações.

Ponderado, falava lento, sem afetação, com inegável dignidade,

resultantes da sua seriedade e da sua honestidade, traços distintivos

que marcavam o seu caráter.

Recebia amavelmente os numerosos visitantes que acorriam de todas as

partes do mundo, para conversar com ele, com os quais falava franca e

animadamente. Em algumas ocasiões apresentava fisionomia radiante, com

um sorriso agradável e prazenteiro.

Nos últimos dias de sua vida, convidava amigos para jantar em sua casa e

depois de debater os pontos mais difíceis e mais controvertidos da

Doutrina, esforçava-se por entreter os convidados. Mostrava-se

expansivo, espalhando bom humor em todas as oportunidades. Gostava de se

distrair contando anedotas de alto nível.

Quando da transferência dos restos mortais de Kardec para o cemitério

Père-Lachaise, Alexandre Delanne que fora convidado a discursar, estando

impossibilitado de fazê-lo, por motivo de doença, envia carta para ser

lida na ocasião.

Nesta carta ele revela o caráter diamantino e principalmente o grande

coração que possuía o homem benevolente que fora Kardec.

Narra ele entre inúmeras citações que certa vez indo com um amigo até a

casa de Kardec, esse companheiro passou a contar para ambos o sofrimento

de um ancião que, vivendo sob difíceis provações, não tinha roupas

adequadas para o frio e agasalhava seus pés em tamancos de madeira

rudemente trabalhados. Mas este homem, longe de lamentar-se com vergonha

de pedir algo a alguém, resignava-se lendo um livro espírita que lhe

infundia grande consolo e conformação, trazendo-lhe esperanças de um

futuro melhor. Delanne cita que nesta instante viu rolar dos olhos de

Kardec uma lágrima de compaixão e, confiando ao companheiro algumas

moedas de ouro, pediu que este as levasse para prover as necessidades do

ancião. Não satisfeito, solicitou-lhe voltar no dia seguinte, pois sendo

o ancião espírita, Kardec prometia providenciar algumas obras que

pudessem facilitar sua instrução, já que o mesmo não dispunha de

recursos para adquiri-las.

Nesta mesma carta Delanne narra também o episodio em que uma família

fora despejada e conduzida à extrema miséria. Sabendo do ocorrido,

Kardec, mesmo sem conhecê-los, sem cogitar se eram espíritas ou não,

forneceu os recursos para tirá-los da miséria, evitando, inclusive o

suicídio de um pai de família.

 

Entre outras citações, encerra a carta Delanne narrando: Não mais

pararia eu de falar, se tivesse necessidade de vos lembrar os milhares

de fatos desse gênero, conhecidos tão somente por aqueles que Allan

Kardec socorreu; não amparava apenas a miséria, levantava, também, com

palavras confortadoras, o moral abatido. Jamais, porém, sua mão esquerda

soube o que dava a direita.


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